A Controladoria-Geral da União (CGU) publicou, em 10 de setembro de 2025, a Portaria nº 3.032, que apresenta oito enunciados administrativos destinados à uniformização de entendimentos sobre a responsabilização administrativa de pessoas jurídicas pela prática de atos de corrupção. A medida busca conferir maior previsibilidade à aplicação da Lei nº
12.846/2013 (Lei Anticorrupção), e, ao mesmo tempo, consolida um entendimento mais abrangente e rigoroso acerca das hipóteses de responsabilização.
Aplicação retroativa do Decreto nº 11.129/2022
O Enunciado nº 1 determina que o Decreto nº 11.129/2022, que regulamenta a Lei Anticorrupção, deve ser aplicado a todos os Processos Administrativos de Responsabilização (PAR) desde sua entrada em vigor, em 18 de julho de 2022, de modo que, mesmo quando os fatos sob apuração sejam anteriores, a dosimetria da multa deverá seguir os critérios previstos nos artigos 22 e 23 do novo decreto, ainda que as regras do revogado Decreto nº 8.420/2015 fossem mais favoráveis à empresa investigada.
O conceito ampliado de vantagem indevida
O Enunciado nº 2 traz uma das alterações interpretativas mais relevantes ao ampliar o conceito de vantagem indevida previsto no artigo 5º, inciso I, da Lei nº 12.846/2013. A partir de agora, a vantagem indevida pode incluir bens, serviços ou proveitos de qualquer natureza, tenham ou não valor econômico direto, abrangendo inclusive vantagens de caráter político, moral ou sexual.
Responsabilização sem necessidade de dolo específico
O Enunciado nº 3 afasta a exigência de comprovação de dolo específico ou de contraprestação efetiva por parte do agente público. Em outras palavras, para fins de responsabilização administrativa, basta que o ato lesivo tenha sido praticado pela pessoa jurídica, ainda que não se comprove a obtenção de benefício ou vantagem concreta decorrente da conduta.
A exigência do agente público não exclui a responsabilidade da empresa
De acordo com o Enunciado nº 4, o fato de o agente público solicitar ou exigir a vantagem indevida não afasta a responsabilização da empresa que a oferece, promete ou concede. Assim, eventual iniciativa do agente público não excluí a ilicitude do ato praticado pela pessoa jurídica, que permanece sujeita às sanções previstas na Lei nº 12.846/2013.
Brindes e hospitalidades: parâmetros e limites
Os Enunciados nº 5 e nº 6 abordam, de forma complementar, as condutas envolvendo o oferecimento de brindes e a concessão de hospitalidades por pessoas jurídicas a agentes públicos. O primeiro enunciado reconhece que não se configura ato ilícito quando a pessoa jurídica oferece brindes ou hospitalidades nos estritos parâmetros previstos em lei. Já o Enunciado nº 6 estabelece limites claros, ao afirmar que convites para shows, jogos ou eventos de entretenimento pessoal extrapolam o conceito de hospitalidade e configuram ato lesivo nos termos da Lei Anticorrupção.
Documento falso em licitações e cumulatividade de sanções
O Enunciado nº 7 reforça que a apresentação de documentos falsos ou adulterados em procedimentos licitatórios enseja responsabilização administrativa, independentemente do resultado do certame. Já o Enunciado nº 8 consolida o entendimento de que as condenações em Processos Administrativos de Responsabilização (PAR) implicam a aplicação cumulativa das penalidades previstas no artigo 6º, incisos I e II, da Lei nº 12.846/2013, ou seja, multa e publicação extraordinária da decisão condenatória. Excepcionalmente, nos casos de Acordo de Leniência ou Termo de Compromisso, admite-se a aplicação isolada da multa, sem a obrigatoriedade de publicação da decisão.
Conclusão
A publicação da Portaria nº 3.032/2025 reforça o protagonismo da CGU na busca por uniformizar entendimentos e reduzir divergências na aplicação da Lei Anticorrupção, inaugurando uma nova fase de interpretação mais abrangente e rigorosa do regime de responsabilização administrativa. Ao adotar interpretações mais amplas sobre os conceitos de ato lesivo e vantagem indevida, a Portaria eleva o nível de rigor e amplifica a exposição das empresas a sanções, exigindo atenção redobrada ao cumprimento das normas de integridade. Nesse cenário, torna-se essencial que as pessoas jurídicas reavaliem seus programas de compliance, políticas de integridade e protocolos de interação com o poder público, prevenindo-se de eventuais enquadramentos diante das novas diretrizes interpretativas.

